segunda-feira, 10 de novembro de 2008

ONU adverte que conflito no Congo ameaça se espalhar

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, alertou ontem para o risco de o conflito no leste do Congo espalhar-se por toda a região dos Grandes Lagos - envolvendo países vizinhos como Angola, que já teria infiltrado soldados no Congo - e pediu um cessar-fogo imediato.

O alerta foi feito durante encontro de líderes africanos em Nairóbi, Quênia, no mesmo dia em que a própria ONU foi acusada pela organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) de piorar os efeitos do conflito ao investir em ações militares para resolver problemas humanitários.

Por considerar que não há segurança suficiente na zona de conflito, as Nações Unidas passaram a usar escoltas armadas nos comboios de distribuição de alimentos.

Para o MSF, isso aumenta a confusão entre civis e militares e impede que agências como a Cruz Vermelha Internacional e o próprio MSF ganhem a confiança dos grupos armados para chegar às vítimas. "Já vimos onde essa estratégia pode nos levar", disse ao Estado o diretor-executivo do MSF no Brasil, o marroquino Eric Stobbaerts, que esteve quatro vezes no Congo nos últimos quatro anos.

Ele lembra que "no Afeganistão, militares começaram a fazer operações humanitárias. Isso causou confusão na população e nos grupos armados sobre quem está lá para ajudar e quem tem uma agenda política e militar".

"Essa percepção confusa e negativa dos trabalhadores humanitários pode ter sido responsável pela morte de cinco colegas nossos no Afeganistão. É importante que o mesmo não ocorra no Congo."

A ONU mantém atualmente 17 mil militares no Congo, entre eles 300 uruguaios.

Esta já é a maior operação das Nações Unidas em todo o mundo e deve crescer ainda mais caso o Conselho de Segurança aprove o pedido feito ontem para o envio de pelos menos mais 3 mil capacetes-azuis."

As coisas pioraram.

A situação é muito, muito ruim", disse Edmond Mulet, assistente do secretário-geral da ONU para missões de paz.Ban reconhece que a solução para o conflito "tem de ser política, não pode ser militar".

Há duas semanas, centenas de civis congoleses protestaram contra o que consideraram uma omissão das tropas da ONU diante dos ataques da milícia rebelde.

Agora, as agências humanitárias reclamam da militarização das operações de ajuda da ONU.

GENOCÍDIO

"Os comboios armados de assistência para Goma e Rutshuru são uma resposta inadequada para a crise", disse o comunicado do MSF.

Anne Taylor, uma das chefes da missão em Goma afirmou que "há um risco de que a ajuda seja manipulada por atores políticos ou militares e as agências humanitárias passem a ser vistas como partes do conflito (por andarem armadas ou escoltadas)".

No encontro de ontem, no Quênia - que teve a participação de sete presidentes africanos -, o secretário-geral pediu o cessar-fogo imediato entre os rebeldes tutsis liderados por Laurent Nkunda e o Exército congolês, subordinado ao presidente Joseph Kabila, da etnia tutsi, mas, antes do fim do diálogo, o porta-voz dos rebeldes tutsis, Bertrand Bisimwa, já dizia que a reunião tinha sido "outra cúpula para nada".

Tutsis e hutus enfrentam-se há pelo menos duas décadas na região.

Em 1994, os hutus foram acusados de cometer o maior genocídio desde a 2ª Guerra, matando 500 mil tutsis em Ruanda.

Em seguida, fugiram para o Congo, onde constituem hoje a maior parte da população e detêm o controle do governo.

Após o massacre, a minoria tutsi no Congo organizou uma milícia rebelde, acusada de receber o apoio do atual presidente de Ruanda, Paul Kagame.

A guerrilha ocupou grande parte da Província do Kivu Norte, na região de fronteira entre os dois países, provocando uma surpreendente retirada das tropas da ONU e do Exército congolês.

Os dois lados chegaram a assinar um frágil cessar-fogo em janeiro, violado apenas sete meses depois.

Desde então, 250 mil pessoas já fugiram de suas casas no Kivu Norte.

As agências humanitárias estimam que quase um quinto da população do Kivu Norte - 6 milhões de pessoas - viva deslocada, um número pode aumentar já que os combates de hoje chegaram a apenas 15 quilômetros de Goma.

COM AP E AFP

NÚMEROS DA GUERRA

250 mil congoleses fugiramde suas casas desde agosto deste ano

500 mil ruandeses da etnia tusti foram mortos no pior genocídio desde a 2ª. Guerra, em 19945.

500 guerrilheiros fazemparte das tropas rebeldes tutsis comandadas por Laurent Nkunda

17 mil militares fazem parte das tropas da ONU no Congo

3 mil soldados a mais serãopedidos ao Conselho de Segurança como reforço às tropas da ONU

365 toneladas de alimentose 60 mil litros de água já foram distribuídas pela Cruz Vermelha nos campos de refugiados

7 meses foi o tempo quedurou o último acordo de cessar-fogo entre o Exército do Congo e os rebeldes

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